terça-feira, 29 de novembro de 2011

Planejamento e Avaliação da Aprendizagem – Aula IV


A concepção de erro no processo avaliativo

Esta aula pretende levar o aluno a compreender que a avaliação da aprendizagem não se encerra com a constatação dos erros. Pretende também levar o aluno a concluir que no processo avaliativo, faz-se necessário agir sobre o erro: compreender sua natureza, suas causas, suas origens e atuar, objetivando a correção dos mesmos.

Erro: seu significado na prática escolar

Para Luckesi (1995, p. 48) ao erro tem sido atrelados a ideia de culpa, fracasso e castigo. Dessa forma, o erro começa a ser encarado como algo desonroso e proscrito.

E o que é considerado “erro”?

Se consultarmos um dicionário, encontraremos vários significados para o verbete errar e todos com conotação negativa:

• Enganar-se.
• Falhar, equivocar-se.
• Juízo falso, engano.
• Desvio do caminho considerado correto, apropriado.
• Inexatidão.

Na prática escolar, em geral, o erro tem sido visto como prova do fracasso ou da incapacidade do aluno, sendo passível de punição e crítica. É algo que precisa ser evitado e corrigido, logo, é algo que se precisa ocultar. Os erros, a dúvida, têm sido percebidos como ignorância, falta de capacidade, preguiça. Isso faz com que sejam negados, camuflados por medo da punição, exposição à execração. Fica uma preocupação mais com o que aparenta ser, do que com a aprendizagem.

Para poder corrigir os erros dos alunos, é importante que o professor aprenda a identificá-los e a saber em que momento do processo de ensino e aprendizagem aconteceram. Só assim, ele poderá orientá-los conforme sua necessidade no momento. Porém, para que ele “acerte mais”, é preciso que tenha oportunidade de “errar” sem ser penalizado, punido.

Creio ser ilustrativa a situação que Luckesi (1995) nos apresenta:

Diz-se que Thomas Edison fez mais de mil experimentos para chegar ao bem sucedido na descoberta da lâmpada incandescente. Conta seu anedotário biográfico que, após muitos experimentos mal sucedidos, um seu colaborador quis desistir do empreendimento e Edison teria comentado: “Por que desistir agora, se já sabemos muitos modos de como não fazer uma lâmpada? Estamos mais próximos de saber como fazer uma lâmpada”. Os insucessos foram, assim, servindo de trampolim para o sucesso de sua busca. O insucesso, neste contexto, não significa erro; ao contrário, serve de ponto de partida para o avanço na investigação ou na busca da satisfação de uma necessidade prática utilitária. (LUCKESI, 1995, p. 56 – 57)

É sabido que o erro faz parte do processo de aprendizagem e que tem um lugar importante na construção do conhecimento. Porém, não se deve confundir erro com negligência, falta de compromisso, irresponsabilidade, desatenção. Não podemos, como professores, aceitar a negligência ou o descuido naquilo que se ensina, no modo como se ensina e também, por parte do aluno, no modo como aprende, ou seja, a falta de compromisso com o aprendizado, com a profissão que mais tarde exercerá. O erro sim, esse ocorrerá.

Luckesi (1995) nos alerta para o entendimento de que não significa “buscarmos” os erros, a “apologia do erro”. Significa sim, percebermos que apesar das orientações do professor, o aluno comete erros e que os mesmos não devem ser percebidos como “fonte de castigo”, mas como “fonte de virtude”, de crescimento, de aprendizagem.

Na prática avaliativa, ao deparar-se com o uma situação de erro, o professor é instado a culpar o aluno e puni-lo com uma nota baixa, sem fazer as correções do processo, dos erros cometidos. Isso faz com que o aluno permaneça na mesma situação em que se encontrava, agora com o estigma de incompetente.

A relação entre erro e nota baixa também tem tirado da escola a responsabilidade no que se refere ao não aprendizado do aluno. Sobre essa ideia aborda Vasconcelos:

O que fundamenta a ênfase na nota é a idéia de que nem todos são capazes de aprender, nem todos merecem continuar, pois, embora tendo “igualdade de oportunidade”, não souberam aproveitar ou não têm, de fato, condições para tal, cabendo à escola a tarefa de identificar uns e outros e dar encaminhamento merecido. (VASCONCELOS, 1995, p. 61).

A avaliação, nesse contexto, tem atribuído somente ao aluno a responsabilidade pelo seu fracasso escolar, ocultando a função seletiva e de submissão atribuídas à escola. Assim apresentada, a avaliação tem se distanciado de sua função em se tratando do diagnóstico do processo ensino e aprendizagem, na busca do seu contínuo aprimoramento. Ela funciona como um instrumento disciplinador, servindo para obter o silêncio aparente, e como “motivador artificial” para a aprendizagem, visto que o aluno estudará por temer a nota baixa e não motivado em aprender.

A seguir apresento um texto que provoca nossa reflexão acerca da função do erro no processo avaliativo e as correções feitas por parte dos professores, orientadas por modelos previamente definidos:

 Revoltado ou criativo

Há algum tempo, recebi um convite de um colega para servir de árbitro na revisão de uma prova. Tratava-se de avaliar uma questão de física, que recebera nota zero. O aluno contestava tal conceito, alegando que merecia nota máxima pela resposta, a não ser que houvesse uma “conspiração do sistema” contra ele. Professor e aluno concordaram em submeter o problema a um juiz imparcial, e eu fui o escolhido. Chegando à sala de meu colega, li a questão da prova que dizia: “Mostre como se pode determinar a altura de um edifício bem alto com o auxílio de um barômetro”. A resposta do estudante foi a seguinte: “Leve o barômetro ao alto do edifício e amarre uma corda nele; baixe o barômetro até a calçada e em seguida levante-o, medindo o comprimento da corda; este comprimento será a altura do edifício.” Sem dúvida era uma resposta interessante e de alguma forma correta, pois satisfazia o enunciado. Por instantes vacilei quanto ao veredicto. Recompondo-me rapidamente, disse ao estudante que ele tinha forte razão para ter nota máxima, já que havia respondido à questão completa e corretamente. Entretanto, se ele tirasse nota máxima, estaria caracterizada uma aprovação em um curso de física, mas a resposta não confirmava isso. Sugeri, então, que fizesse uma outra tentativa para responder à questão. Não me surpreendi quando meu colega concordou, e sim quando o estudante resolveu encarar aquilo que eu imaginei seria um bom desafio. Segundo o acordo, ele teria seis minutos para responder à questão, isto após ter sido prevenido de que sua resposta deveria mostrar necessariamente algum conhecimento em física. Passados cinco minutos ele não havia escrito nada, apenas olhava pensativamente para o forro da sala. Perguntei-lhe então se desejava desistir, pois eu teria um compromisso logo em seguida e não tinha tempo a perder. Mais surpreso ainda fiquei quando o estudante anunciou que não havia desistido. Na realidade, tinha muitas respostas, e estava justamente escolhendo a melhor. Desculpei-me pela interrupção e solicitei que continuasse. No momento seguinte, ele escreveu essa resposta: “Vá ao alto do edifício, incline-se numa ponta do telhado e solte o barômetro, medindo o tempo (t) de queda desde a largada até o toque com o solo. Depois, empregando a fórmula h = (1/2)gt² , calcule a altura do edifício.”

Perguntei então ao meu colega se ele estava satisfeito com a nova resposta e se concordava com a minha disposição em conferir praticamente a nota máxima à prova. Concordou, embora sentisse nele uma expressão de descontentamento, talvez inconformismo.

O texto nos convida à reflexão sobre o processo avaliativo e sobre a forma como os erros dos alunos são corrigidos e percebidos. Todos têm que expressar a mesma resposta, no mesmo espaço de tempo. Sem considerar os ritmos de aprendizagem, as dificuldades individuais. 

Esse autoritarismo da escola, explicitado nas correções dos erros dos alunos por parte do professor, é uma prática que vem transformando alunos críticos, autônomos em indivíduos submissos, passivos diante dos problemas sociais, obedientes às imposições da sociedade.
O que se evidencia, é que a escola em vez de tornar os conteúdos de ensino mais significativos e interessantes para os alunos, os apresenta a partir de expectativas que não levam em consideração as características dos alunos como grupo social, agindo assim, como instrumento de exclusão dos alunos pobres, já excluídos socialmente, pois são eles que mais se distanciam das regras e normas e a forma como os conteúdos são apresentados pela escola. Sob uma aparente exclusão técnica, realiza-se uma seleção social, atingindo profundamente a autoimagem dos alunos, que levarão consigo a falsa percepção de que fracassaram, porque são de fato incompetentes e, portanto, não merecem mais do que têm.

Luckesi (1995), nesse sentido, faz uma distinção entre julgamento e avaliação, diz que na avaliação não há seleção, não há exclusão. Ele a define como um “ato amoroso”, não no sentido piegas, mas sim no sentido de acolher a situação tal qual ela se apresenta, para, a partir daí, tomar decisões visando melhorá-la. Avaliação é, portanto, um ato acolhedor, integrativo, inclusivo e que tem por objetivo incluir novamente o educando, pelos mais variados métodos, no processo de aprendizagem, facilitando assim, seu pleno desenvolvimento.

E quanto ao texto apresentado – “Revoltado ou criativo” – o que acharam?

Seria o aluno revoltado, criativo ou podemos afirmar que ele ainda não foi “domado” pela escola. O que pensam acerca disso?

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